terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

E agora são os horários!

“Vários juízes e magistrados do Ministério Público (MP), um pouco por todo o País, estão há meses a fazer uma espécie de greve de zelo, marcando e dirigindo julgamentos e diligências apenas dentro do horário de funcionamento dos tribunais. Ou seja, até às 17.00.”
DN

Qual é o horário de funcionamento dos Tribunais?
A que Tribunais se refere a notícia?


Até agora celeridade processual, na opinião do Governo, dependia sobretudo das férias judiciais porque é muito mais fácil transferir essa responsabilidade para o conceito de prazo judicial, subjugando todos sem especificar carreiras e hierarquias, mas não estará o Governo a preparar novas regras sobre os horários?
Será por isso que são mencionadas no boletim de vencimento as horas extraordinárias?

Os titulares do órgão de soberania Tribunais, na realidade, dependem, no exercício das suas funções, de toda a ambiência disponibilizada por uma das “pastas” de outro órgão de soberania apesar do art. 202.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
Sem querer indagar aqui a aptidão, porque a competência não se discute, o Governo regulamenta a Lei e surgem as Varas Mistas (note-se que o que aqui se aborda não é problema específico destes tribunais) tribunais de competência mista, cível e criminal a que corresponde uma secção de processos. Ainda com a mesma competência, regulamenta o número de lugares de oficial de justiça nessa secção, todos os seus deveres e direitos e, através de concurso público (fora as excepções), escolhe quem os ocupa.

Podemos neste momento situarmo-nos numa Vara Mista, com uma secção de processos composta por sete lugares de oficiais de justiça de três categorias, exactamente os mesmos de uma secção de Juízos Cíveis ou Criminais.
Em secções de processos problemáticas como as das Varas Mistas, veja-se a título de exemplo as Varas Mistas de Sintra, de Loures ou de Setúbal, em que a complexidade e o volume de processos são já elementos suficientes para o atraso processual, o Magistrado Judicial tem ainda de coordenar os funcionários que couberam à secção de processos.
A maior parte são pessoas esforçadas e dedicadas mas sem formação específica para o cargo que ocupam. As horas esporádicas de instruções lacónicas não os habilita a rentabilizar o serviço pelo que, necessariamente, são os Magistrados, as horas extraordinárias e os anos de carreira que vão optimizando o seu trabalho.

Este é o nosso melhor cenário.

O outro é aquele em que se consegue reunir um escrivão de direito com vinte ou mais anos de carreira que exerce as suas funções sem capacidade de organização nem mesmo de delegação porque nunca o prepararam para tal (alguns mesmo com exaustiva preparação nunca saberiam chefiar), dois ou três escrivães adjuntos sem experiência dado a recente promoção e três auxiliares sem desembaraço para o cargo.
E porque numa situação destas é impossível manter o andamento normal dos processos, ora porque o expediente a juntar se acumula, ora porque os julgamentos não se realizam devido às falhas no cumprimento dos despachos ora porque não existe critério em concluir processos para elaboração de despacho saneador ou sentença podendo numa semana ser vinte e na outra nenhum entre outros “oras”, surge o inevitável caos processual e humano e nem as horas extraordinárias de todos chegam para colmatar as deficiências graduais.

Perante tal, não é suficiente reclamar junto do senhor Secretário do Tribunal pois quaisquer dos funcionários que sejam indicados para uma secção com tal cenário depressa se mostram doentes e incapacitados ou aceitam sem a intenção de melhorar e com a esperança de rapidamente saírem no movimento seguinte.

Anos passarão e a situação agravar-se-á sem que haja qualquer alteração. Os processos não têm o andamento normal e as reclamações de quem necessita de ver os seus problemas resolvidos torna-se diária.
Nestes casos, a diminuição das férias judiciais não favorece o andamento processual, pelo contrário, o processo está parado até que a secção notifique a contestação à parte contrária.

Até aqui, as férias judiciais numa Vara Mista com o cenário descrito serviam para tentar recuperar alguns atrasos, agora servem para o seu fim, férias.

Continuamos na saga da mediocridade.

Se é este o cenário até aqui como será daqui para a frente?
Os funcionários são os mesmos.
Irá o Governo extinguir as Varas Mistas?
Irá o Governo aumentar o número de funcionários nestes Tribunais de competência Mista ou irá manter o número e colocar pessoas com qualificações, formação e remuneração adequadas às necessidades dos mesmos?
Irão os senhores jornalistas frequentar formação jurídica ou continuarão com as mesmas fontes?

sábado, 14 de janeiro de 2006

Mais uma forma de ganhar dinheiro

A nossa situação está a tornar-se caótica.
Haja quem consiga explicações para tamanhas atrocidades.

Um cidadão português dois dias depois de ter assinado na Conservatória do Registo Civil o divórcio, porque ainda não tinha o estado civil alterado no seu bilhete de identidade pediu à, já, ex-mulher que o acompanhasse ao banco a fim de assinar uma letra.
A letra estava associada a uma conta à ordem cujo titular é a sociedade unipessoal por quotas que o ex-marido constituiu poucos anos antes.
A ex-mulher acedeu ao pedido: não era titular da conta, já estava divorciada, não iria usufruir de qualquer quantia e confiou que a letra seria paga atempadamente.
Passados poucos meses o cidadão português informou a ex-mulher que a letra estava paga.

Para espanto desta ex-mulher, numa madrugada, recebe um telefonema do cidadão português, que disse encontrar-se fora de Portugal, a informá-la que, caso fosse contactada pelo banco com o intuito de saberem do ex-marido ou para que a letra fosse paga, não se preocupasse. Bastaria fazer-lhe um telefonema e, rapidamente, o dinheiro estaria na posse dela a fim a dívida.
Compreensivamente, a ex-mulher ficou atónita com a informação.

Na primeira oportunidade dirigiu-se à agência do banco e indagou quanto à sua responsabilidade naquela dívida.

Ficou a saber que era avalista numa letra do ex-marido e que, por a conta da tal sociedade unipessoal pertencer ao mesmo banco onde tinham uma outra conta solidária ainda activa mas sem saldo, esta não poderia ser fechada ou movimentada. O controlo de todas as contas seria obrigatório.

Dominada pela revolta tenta o contacto telefónico com o ex-marido através dos quatro ou cinco números de que ele é titular e perante o insucesso deixa mensagem na caixa de correio.
O relatório da mensagem é positivo, foi recebida.
Espera que o telefone toque.
Quando percebeu que não ia atender qualquer chamada do ex-marido tentou de novo contactá-lo. Ficou em pânico. Qualquer dos números que tinha utilizado tinha a mesma advertência: “O número de telefone para o qual ligou não se encontra atribuído”.

Naquele momento, aquela ex-mulher estava com uma filha para criar e com uma dívida que não tinha como pagar.

Mas como estamos em território onde a aldrabice e corrupção são consideradas meias virtudes, o melhor ainda estava para vir.

Ora, o ex-marido tinha dito, se se lembram, que estava fora de Portugal, estaria no norte da Europa, segundo ele. E disse também que como os negócios não lhe estavam a correr muito bem talvez ainda fosse ao Brasil, onde tinha familiares.

Após tanta informação a ex-mulher concluiu que perante as dificuldades que ele teria que enfrentar, com certeza, não voltaria a Portugal tão depressa.

Passaram dois ou três dias em que ela nem sequer dormiu, amaldiçoando aqueles anos que tinha desperdiçado ao lado de alguém irresponsável e insensível.

Quando tocou o telefone, uma amiga diz-lhe que viu a sua ex-sogra e o seu ex-marido a caminho do Cartório Notarial onde iriam assinar a escritura de compra e venda de um terreno pago por ele mas que ficaria em nome da mãe.
Ficou sem palavras.

De imediato, telefonou para a ex-sogra sem revelar os pormenores e perguntou se tinha algum contacto do ex-marido e aquela, a sangue-frio, respondeu que não e que já há muito tempo, talvez semanas, não falava com ele.

Consumida pela fúria constatou que caiu numa armadilha. Ele já a tinha avisado que se a tal sociedade não resultasse abriria falência e ficaria tudo resolvido.

O cidadão português continua a viver bem a vida. O dinheiro existe.

Caminhamos para o caos.
Já não há honra, orgulho ou dignidade.

A sociedade, e sobretudo quem a representa e dirige, pretende dissipar os valores seculares de gente trabalhadora e honesta.

Hoje os valentes são os corruptos, os virtuosos são os espertos.